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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

A tevê que você não vê

Detentos no Ceará fazem greve de fome por direito a sanduicheira e TV nas celas.

Nada contra os pedidos dos moradores da Casa de Privação Provisória de Liberdade, mas que tal estender idêntica liberdade a quem está preso ao trabalho e dívidas?

Os inquilinos de Pedrinhas, no Maranhão, vivem situação oposta a dos colegas cearenses.

Aqui, a quantidade de ratos no presídio é tamanha que falta fome e ânimo para greves.

A viúva devassa (dois)

A senhora esperou a noite inteira a morte do morte. O dia veio encontrá-la sentada em cadeira do quarto, e nada do aviso da sua viuvez.

Não lembrava se chorara, não lembrava de coisa alguma senão da voz do mensageiro a trazer dor que não conhecia.

Lá pelas tantas, ainda com o vestido da noite anterior, rumou ao cabaré do sucedido.

Encontrou o homem inerte em chão que lhe parecera lavado com sangue. O senhor de posses e poder de mando mantinha os olhos abertos, e dele não escapam palavrões e gestos.

As quengas e o farmacêutico tentavam a custo estancar o maldito sangue negro que saltava aos borbotões de todos os malditos orifícios daquele corpo que a tantos mandou saber do inferno antes.

Durante três dias e três noites a senhora e as quengas esperaram o último suspiro do sangue.

Durante três dias e três noites esperaram médico e padre que soubessem do senhor à espera de outro mundo também seu.

Senhora e quengas lembraram.

Exceto o senhor, todos os que conheceram a única entrada e saída da cidade estavam mortos, mais mortos que o homem que os mandara saber como escapar do inferno. 

A viúva devassa (um)

Não lembro ter lido ou visto em filmes nada sequer próximo a caso ocorrido no interior do Maranhão, anos atrás.

Casada com homem de posses e poder de mando, a jovem senhora vivia submetida a seguidos e intermináveis castigos.

Ora era encarcerada na própria casa, ora o feitor a proibia de lhe dirigir voz ou olhar.

Os estupros e surras medonhas foram tantos, e por tantas noites, que esqueceu quando deixou de contá-los.

Durante anos sentiu o homem deixar em seu corpo o resto de suas fêmeas; durante anos o viu limpar o sexo ainda sujo em qualquer roupa a apanhar nos olhos. 

Fechava os olhos com força, mas era mais agudo o fedor animalesco a lhe revolver as entranhas.

Vinham os vômitos e as diarreias, vinha outra noite e nada da morte a quem tanto chamava.

Certa madrugada de chuvas torrenciais, mandaram acordar a senhora.

O mensageiro trazia notícia urgentíssima: o senhor caíra de escada num cabaré, a queda tão grande e feia que dele arrancara mais sangue e agonia que dos porcos recolhidos para as festas da padroeira. 

- O homem está às portas da morte! - gritou, e desapareceu em seguida no aguaceiro.