Vem do latim vulgar a língua?
Então que a vulgarizem nas ruas. Dêem-lhe putas, puteiros, putadas, putanheiros. Que puta língua!
Goza essa língua? Na ponta da língua.
Puta goza? Da cara de quem lhe goza.
Onde goza? No Xirizal.
Língua suja essa! E afiada.
Porra, seus putos, que putaria!
Putada e puteiro sem xiri, nem vá.
Xiri é priquito, tabaco, prexeca. Xiri só maranhense fala, só maranhense tem fome. Come, pede mais, empanturra-se no Xirizal. Também se gosta de grelo.
Grelo?
De qual buraco saíste, seu fuleiro? Grelo é pinguelo, não há mulher da terra que saiu sem ele. Mulher de clitóris ou clítoris nem me encoste. Cabaço tu conheces?
Nunca vi, nunca ouvi falar. Nem de um, nem do outro.
Vê-se que és qualira. Pois saiba que aqui os olhos grelam quando o grelo é farto.
Que língua estranha a vossa!
Nada tem de estranha.
Qualiragem é coisa de qualiras; fuleiragem, de fuleiros.
Quando puser os pés nesta França Equinocial venha de japonesa, chamató ou sapato de enfiador.
Pra sua saúde, livre-se dos bogues, não curie a vida do vizinho, não breche a vizinha no banho, não meta o bedelho em conversa alheia, não tente apartar briga de marido e mulher, nem levante o texto da panela de quem lhe convidou.
Abaixe o facho pros mais velhos, aceite o mocho que lhe estendem, prove pirão de farinha-d´água, não faça desfeita se lhe oferecerem peixe-pedra, arroz-de-cuxá e Jesus.
Atenha-se a carecer, que é verbo traiçoeiro. Carece não? Então tá.
Em qual outra língua cagada dá sorte, senão nessa? Eta cagão sortudo!
Cuidado com o que diz. Cagão é homem frouxo. Encomende caixão e alma se por descuido chamar uma mulher de frouxa.
Mulher menstruada fica de bode. Estar bodado é estar sem disposição pra nada. Bode é tipo de papagaio; é artifício pra recuperar os que se perderam. Dar bode é ter confusão por perto.
Está de caganeira, vazando pelo pito? Melhor desistir. Mijada é bruta repreensão. Carne mijada, veja xiri.
Em qual língua estar embocetado é estar com o diabo no couro? A menos que seja chegado, negue o anel de couro, por mais peçam. Dar ou soltar o roscofe segue na mesma toada.
Conserta-se peixe? Conserta-se. Mais limpo, impossível.
Começou no sexo comendo as baratas de casa? Começou bem. Levou barata no dividido e no dominó? Terminou mal.
Quer bacuri, cacholeta? Olha a cabeça...
Quer o cigarro que alguém fuma? Peça o vinte. Um copo de cachaça? Peça um quarto. Fazer acrobacia? Faça pulitrica. Pegar peixes e crustáceos? Pois saiba manejar o puçá.
Essa língua não aprendo!...
Aprende sim, que até o Senhor de La Ravardière dela aprendeu e levou. Pro seu gasto, deixo o que vai lhe caber, seja noite, seja dia.
Saboeira, cancão, borroca, xirizuda, cheiro-verde, pungada, terecô, encriquilhar, crica, crivo, crivador, breado, guisadeira, jongome, trizidela, fiofó, desgranha, desgrota, sacrista, catraio, catraieiro, pitiu, pimba, pimbada, cambada, panada, paneiro, mangar, manina, carambela, cofo, taqueira, escrotidão, escrincha, sura, xexo, rodó, curica, bilha, rir-ri, panariço, abirolado, fodedor, boneca-de-anil; embira; cheira-peido, gronha, cruzeta; ganhador; pegado; moleira; cafufa; troíra; coíra; cascaria; casqueiro; gomoso; cerol, lancear, lanceada, papuda; ariri; melequeira, breba, briba, biriba, gurguminho, redengue, vira-folha, bajogar, birolha, fuçura, lascado, pandu.
Saboeira?
Saboeira é lésbica, mulher-macho. Saboeiras fazem sabão, só não me pergunte se de coco ou de andiroba. Pelo que aqui abunda, diria de coco babaçu.
O maranhense fala o melhor português do Brasil.
Fala não. Perdeu por ignorância e aceitação fácil dos modismos.
Maranhense fala cantando.
Isso faz mesmo. Nascemos espantados, esconjurando males, chamando outros. Da Baixada ao Sertão, do Tocantins ao Litoral.
Essa língua não aprendo.
Pois aprenda, se quiser entender porque essa gente tacanha pôs holandeses e franceses pra correrem do seu quintal, aos portugueses deu banana.
Cacuriá, ritinta, gruli, zabumba, aberturar, dindim, carambolar, escrincha, gargural, encantaria, cujuba, ziquizira, pico-pio, dentiqueiro, porronca, traioto, sembal, lapiseira, orelha-de-macaco, tibungar, pitó, afolozar, poaca, labigó, endiambado, coivara, tortulho, matraca, mataquar, mataquado, trolhar, lapiguaxada, junteiro, batido, fogoió, tuchal, abulhado, caraquento, borroca, chá-de-burro, atochar, groso, chila, chilado, chileiro, gondó, chororô, choro, chorona, barroada, rachada, rancento, dordói, agafe, gobira, chulado.
Aprendeu? Tento. Quando não, invento.